Velha do Rio ganha forma nas correntezas do Rio Doce

Mineiro de Governador Valadares, violeiro e cantor, décimo quarto dos 15 filhos de Inês Ramos Braga, o mestre de obras Levi Braga de Souza acaba de gravar as cenas do seu primeiro curta-metragem “A Velha do Rio”. A história é uma das dez selecionadas pelo Curta Vitória a Minas III. As gravações começaram na terça-feira (02/07) e terminaram nesta sexta-feira (05/07) em Governador Valadares (MG). A chance de fazer o filme chegou na sua vida como um sonho inesperado. Quando soube do concurso, em poucos minutos, ele inventou e inscreveu a trama sobre uma menina cheia de bravura e determinação que decide navegar o Rio Doce para apostar corrida com o trem.

Com um temperamento brincalhão e inventivo, Levi herdou da mãe o jeito alegre e o gosto por cantar e contar histórias. Em algumas delas ele é o próprio protagonista, como no dia em que, ainda criança, saiu pela comunidade onde morava para arrecadar tijolos. “Eu tinha perguntado pra minha mãe por que nossa cozinha era de pau. Ela me respondeu: “porque somos pobres”. Eu peguei um carrinho de mão e fui de obra em obra pedindo tijolo. Alguns deram, outros não, e continuei a pedir até reunir 500 tijolos. Só depois de chegar em casa com o material descobri que precisava também de cimento para construir”, relembra Levi que teve a ajuda do irmão mais velho para terminar de arrecadar os materiais necessários para construir a cozinha de alvenaria para a mãe da qual se orgulha e sente muitas saudades. Hoje, Levi projeta e constrói casas na cidade.

Desta vez, inspirado pela imaginação, ele criou uma aventura vivida por uma menina nas correntezas do Rio Doce. Foram quatro dias de gravação em regiões ribeirinhas onde fosse possível navegar no rio e avistar os trilhos do trem. Para compor e preparar o elenco, o mestre de obras convidou familiares e amigos e se encarregou de contracenar com um e outro para ensaiar os papéis. A protagonista Bianca é interpretada na infância, na adolescência e na velhice, respectivamente, pelas filhas Bianca Belarmino Braga, 7 anos, e Camila Correa Braga, 32 anos; e pela irmã, Aparecida Ramos de Souza. Bernardo Correa Satler, neto do diretor, também participa de uma sequência da história. O amigo José Maria Augusto Celestino, o Zé Aranha, 50 anos, assumiu o papel do pescador e pai, e a amiga Sirleane Barros de Almeida, 34 anos, representou a mãe da personagem principal. O pescador José Gonçalves dos Anjos, Seu Kioto, emprestou o barco, um dos principais elementos de cena, e fez figuração numa das sequências da obra.

“Eu venho preparando o elenco desde que cheguei do curso oferecido pelo projeto. Toda hora que dava uma bobeirinha, eu perguntava pra o Zé Aranha, você sabe já suas falas? Pra ensaiar com ele, fingia que eu era a menina. Com ela, fui fingindo que eu era o pescador. Fui contracenando com eles porque era mais difícil conseguir reunir todos. Eram poucas falas, mas expressões. Eles atuaram muito bem”, relata o diretor. “Foi a primeira vez que eu fiz um papel como ator, mas deu belezinha, certinho. E os participantes da equipe, o câmera, o zoom (técnico de som), todo mundo me aplaudiu e gostou”, destaca Zé Aranha.

O comerciante Zé Aranha contracenou com a cunhada, a vendedora Sirleane Barros de Almeida, que também interpretou um papel no cinema pela primeira vez, um sonho guardado desde a infância. Para ela, a experiência foi diferente e divertida. “O que eu achei bacana foi, mesmo eu não tendo experiência de atuar, ter pessoas da equipe de filmagem me ajudando. Isso foi muito bom, pessoal maravilhoso! Eu gostei, me ajudou e me ensinou bastante. Achei que ia ser difícil encarar a câmera porque tinha muita gente em volta. Depois que fiz a primeira cena de teste, as outras foram mais tranquilas, fui me soltando e perdi a vergonha”, comemora a vendedora.

Para a engenheira ambiental, Camila Correa Braga, filha mais velha do diretor, a oportunidade de interpretar uma fase da vida da personagem lhe trouxe um desafio completamente diferente da sua área de atuação profissional e ver a história tomando forma lhe deu muito orgulho do pai. “Eu achei incrível esta história virar um filme. Desde que o meu pai foi selecionado, fiquei orgulhosa e acompanhei a preparação desta produção. Nunca tinha participado de um filme, nunca tinha atuado. Eu pensei muito na minha infância, apesar de ter feito uma adolescente, mas quando eu era criança andava muito por ali pelo rio. Então, eu tentei lembrar destes momentos para fazer a personagem”, explica a engenheira.

Apaixonado por cinema, Levi Braga costuma assistir aos filmes em busca de erros de gravação. No curso descobriu existir o formato de curta-metragem. Até então, só conhecia os longas-metragens. Foi depois de participar das aulas do curso audiovisual básico e, agora, com a experiência da pré-produção e do set de filmagem que o mestre de obras conheceu os detalhes de uma produção cinematográfica. A turma enfrentou dificuldades como deslocar para lá e para cá equipamentos, profissionais e elenco dentro do rio, lidar com a instabilidade do tempo, monitorar os ruídos ao redor e encarar o cansaço acumulado ao longo dos dias de filmagem, porém, valeu o esforço.

“Fazer o filme foi gratificante e trouxe um aprendizado muito maior porque aconteceu na prática. Dirigir um filme é bem complicado, mas é legal. O apoio que eu tive dos profissionais foi maravilhoso. Se não fosse pela equipe de produção do IMA, não conseguiria nada, e me dediquei bastante também. Acredito que vai ficar muito bom o filme. Agora vou estudar as cenas para na etapa da edição nós conseguirmos chegar  a um resultado interessante que vai agradar a todo mundo”, conclui o diretor que homenageará a mãe dedicando-lhe o filme.

Texto: Simony Leite Siqueira

Fotos: Equipe IMA

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