Depois de ter a história aprovada no concurso do Curta Vitória a Minas III, participar das oficinas audiovisuais, organizar cada detalhe da produção, integrar amigos, familiares, artistas e diferentes grupos culturais nas filmagens, viver os dias intensos de gravação e mobilizar toda a cidade para a exibição, a turismóloga Sandra Coelho chegou ao grande dia de lançamento do filme “Revelações de Carnaval” em sessão gratuita ao ar livre.
O céu da manhã de sexta-feira (29/11) não acordou com cara de chuva. Ao longo do dia, o sol rachava, o calor era intenso. O céu azul entre nuvens. O mormaço trouxe as incertezas do tempo instável: será que vai chover? As previsões eram divergentes, algumas asseguravam céu limpo, outras anunciavam pancadas de chuva. A dúvida angustiou a diretora e a equipe do Instituto Marlin Azul. Como a montagem da tela requer algumas horas, era preciso uma decisão rápida: montar a tela na praça ou na quadra coberta. A experiência em sessões abertas se misturou com a intuição e a esperança das produtoras que assumiram o risco: será na Praça Juquinha Lima, no Morro do Padre, às 19h30. E, se as águas caíssem sobre a terra, a sessão seria transferida para o domingo, 1º de dezembro.
Com o cair da noite, os espectadores começaram a chegar ao espaço de exibição. Pela terceira vez consecutiva, Nova Era tinha uma história selecionada pelo Curta Vitória a Minas para ganhar vida na tela. O clima era de expectativa, curiosidade e a alegria de juntar a comunidade para festejar um dos grandes amores da cidade, o carnaval, um dos personagens da ficção inspirada nas memórias de juventude da autora.
A ficção revive as aventuras de Ana Rabo e Zé Bundão durante um desfile carnavalesco nos anos 1990. E a história foi assim: duas amigas adolescentes inventam os dois personagens para conseguirem brincar (e aprontar) pelas ruas, escondidas das famílias, no Bloco Boca de Gole, o tradicional bloco sujo. Disfarçadas com fantasias feitas de lençóis, fronhas e travesseiros, as meninas saem pelas ruas pregando peças nos foliões sem serem reconhecidas.
Após o cerimonial de apresentação, todos estavam prontos para acompanhar a mostra de filmes feitos a partir de histórias contadas por moradores de cidades do entorno da Estrada de Ferro Vitória a Minas. Cercada por amigos e familiares, Sandra se posicionou na primeira fila para sentir a magia da tela. “Revelações de Carnaval” iluminou a alma festeira do nova-erense. A plateia assistiu atenta ao filme e cantou o hino do Bloco Boca de Gole.
“Esta empreitada da Sandroca foi incrível! Ela consegue levar o mundo junto com ela, o nosso mundo de Nova Era. Ficamos muito felizes com o filme. Foi incrível sentir e reviver, com a história dela, o que a gente vivenciou desde criança porque somos do carnaval. A nossa mãe nos vestia com fantasias para desfilar. Nós temos histórias e memórias lindas porque o carnaval sempre foi um momento muito esperado na cidade. A minha família curtiu muito a festa, tanto o meu pai, seja trabalhando, e a minha mãe, atuando nos blocos, na escola de samba do coração dela, a Desce Ladeira”, relembra a engenheira civil Betânia Mara Coelho Albanez, irmã de Sandra.
Fiel à folia, Dona Neide nutria nas filhas a paixão por uma das maiores festas populares brasileiras. “Houve ano em que eu tive que desfilar em duas escolas porque eu não podia faltar na escola de coração da família, mas eu também tinha uma turma que ia sair numa outra escola. Minha mãe ficou foi muito brava com isso e me fez descer de um carro alegórico, trocar de fantasia e desfilar na outra escola”, lembra a engenheira civil.
Diante da telona, Betânia reviveu momentos guardados ao lado da família e da comunidade. “Foi incrível ver na tela parte desta aventura da Sandroca e da Ana. Eu voltei no tempo, ouvindo todas aquelas músicas, sentindo aquele movimento ali na rua, na Avenida Governador Valadares, que sempre foi o ponto central de desfile das escolas e que, hoje, é onde acontece o carnaval MPB de Nova Era. E ver ali o cenário do bar do meu pai, a dinâmica toda dele trabalhando, tocou fundo no coração. Estamos muito felizes com esta história ter virado um curta. Sandrinha tem a mente mágica, o dom de levar as pessoas junto com ela nos projetos que cria, desde as crianças aos idosos. Sandra agrega e envolve a comunidade. Ela merece muito este prestígio”, comemora Betânia que acompanhou a sessão ao lado do filho Mateus, um dos personagens da obra.
O resgate dos antigos carnavais é também uma homenagem ao comerciante Raimundo Fernandes Coelho, personalidade saudosa na cidade, pai da diretora. Por muitos anos, ele comandou o Bar Central, ponto de encontro dos foliões. No filme, o gestor ambiental Flamínio Guerra Guimarães, amigo da família, interpretou Raimundo num dia de bar lotado e muito trabalho. “Foi gratificante participar da sessão e ver o produto final de um trabalho de dedicação de muitas pessoas, principalmente, da Sandra. A gente ficou feliz de ver este filme que retrata fielmente como eram os carnavais de Nova Era. Eu fiquei orgulhoso de ver a minha participação, honrado de representar o Raimundo, pai de duas grandes amigas, Sandra e Betânia”, agradece o gestor.
Quem viveu o próprio papel na história foi Isaías Lândio da Silva. Nos velhos tempos retratados na obra, ele era assistente de Raimundo no bar. “O filme ficou muito bonito. Achei importante estar ao lado deste grande elenco. Eu fico honrado por ter feito parte deste evento maravilhoso e agradeço a Sandra pelo convite e a todos que fizeram parte também. Que Nova Era possa ter mais pessoas interessadas em se inscrever e ter uma história selecionada no projeto”, destaca Isaías.
“Revelações de Carnaval” é uma divertida aventura vivida por duas amigas adolescentes há mais de 30 anos. Uma delas é a Zé Bundão, personagem vivida pela Sandra na vida real. A outra é a sua amiga Ana Cândida Martins de Assis Pocceschi, a Ana Rabo, que levou o marido, as duas filhas, o genro e o netinho de pouco mais de um mês de idade, além da mãe, dos irmãos, primas, sobrinhos e afilhado, para assistirem juntos ao filme sobre suas memórias de adolescência.
“Foi extraordinário! Foi uma emoção sem palavras. Parece que eu voltei ao tempo, no ano de 1992, quando aconteceu este carnaval. Eu me senti como se estivesse vivendo tudo de novo. Foi aquela mesma emoção do dia, da nossa história, do nosso carnaval, do nosso bloco. Foi tudo igualzinho e com muita emoção. O filme me proporcionou rever um dos momentos mais importantes da minha vida”, celebra Ana. A professora Pabline Clara Machado interpretou Ana Rabo no curta-metragem.
A autora escolheu a analista de Departamento Pessoal Fernanda Vitorino Costa para o papel de Zé Bundão. A jovem passou a semana divulgando e chamando todo mundo para a sessão. “Na hora que começou o filme, o coração acelerou porque é uma emoção muito grande pra quem participou e uma ansiedade absurda. Quando começou a passar as cenas e fomos voltando naquele tempo da gravação, lembrando do tanto de trabalho que deu para gravar e encaixar as falas no momento certo, fiquei muito satisfeita com o resultado. Eu estava mega ansiosa para me ver no telão porque é uma experiência muito diferente pra quem nunca passou por isso. Ao ver as cenas, foi passando um filme na minha cabeça como se eu tivesse participado daquele dia na vida real. E relembrar, falar do carnaval da cidade, ver cada referência desta festa, foi muito gratificante. Não vejo a hora de assistir de novo porque foi um momento único que vou guardar para a minha vida toda”, descreve Fernanda.
O arquiteto e arte educador Dimas Volpato atuou como cenógrafo do filme ao criar os ambientes inspirados na memória afetiva da autora. Hoje ele vive em São Paulo e não pôde assistir ao filme na praça do Morro do Padre, em Nova Era. No entanto, através de uma chamada de vídeo feita da plateia, ele acompanhou o lançamento do curta junto com alguns amigos da capital paulistana.
“Foi lindo demais ver este curta tão amado pela cidade, ver a praça cheia, todos atentos, vibrando juntos a cada cena. Eu consegui reunir alguns amigos, muitos deles tinham acompanhado as filmagens através dos stories, com outros eu havia conversado sobre o trabalho de cenografia no filme, todos estavam curiosos para ver o filme. E as lágrimas rolaram. É muita emoção ver tanto trabalho, tanta dedicação, tanto carinho, porque foi uma imersão muito legal e gostosa de participar. E a gente chega neste resultado final de ver os detalhes todos do filme, esta visão incrível da Sandra. Eu mesmo não quis participar dos últimos três takes da gravação para ter este gostinho de ver na tela uma cena que não vi gravar. Foi muito bonito ver tudo isso. A galera daqui também gostou demais. Eu fiquei bastante emotivo, até pelos grandes amigos que fiz na cidade, pela Sandra e por todos os colegas e amigos, pelo projeto incrível, por vivenciar tantas coisas legais como a produção do filme”, destaca Dimas.
Após o término da sessão, a plateia acolhida pelo cinema dançou ao som da Bateria Pé de Pombo. E, minutinhos depois, na hora da desmontagem da tela, a chuva chegou. “Durante o dia ficamos numa tensão se colocava a tela na praça ou na quadra por causa da chuva prevista. Deus foi tão bom comigo que até o tempo ele segurou. Foi uma sensação de dever cumprido e uma mistura de batida do samba no peito com paixão à primeira vista. Foi sensacional! Nunca vi nada igual. Deu tudo certo, graças a Deus. A praça lotou. Acho que as pessoas curtiram. A expectativa do filme foi alcançada e a emoção é indescritível. Eu fiquei na primeira fileira, nem olhei pra trás porque na telona é outra sensação. Ver a história na tela grande é uma emoção que não se descreve. Fiquei muito emocionada, orgulhosa, deslumbrada com tanto profissionalismo de todo mundo”, comemora Sandra Coelho.
A caravana de cinema segue agora para a última sessão. O Circuito de Exibição do Curta Vitória a Minas III se encerrará na terça-feira (03/12), às 19h30, em João Monlevade. A sessão acontecerá no Sindicato dos Metalúrgicos, com destaque para o lançamento do filme “Me Disseram que Sou Negra”, de Alexsandra Felipe.
Texto: Simony Leite Siqueira
Fotos: Mariana de Lima