Itapina abraça gravações de drama inspirado no último trem

Vinte e quatro de outubro de 1975 marcou a passagem do último trem na rua principal do centro de Colatina (ES) para a retirada dos trilhos da Estrada de Ferro Vitória a Minas. A ferrovia instalada na primeira década do século XX havia impulsionado o desenvolvimento do município, fortalecendo-o como um dos mais importantes centros econômicos do estado, porém, em meados da década de 70, a circulação dos longos trens de cargas e passageiros tornou-se um desconforto para a movimentação de carros, caminhões e pedestres na região central que crescia de modo acelerado.

Com a duplicação da Estrada de Ferro Vitória a Minas, a linha foi deslocada para uma variante em outro ponto da cidade, a três quilômetros do centro. A retirada dos trilhos é a inspiração para a história “O Último Trem”, escrita por Fabrício Bertoni, um dos selecionados do Curta Vitória a Minas II.

As gravações do curta-metragem aconteceram nos dias 28 e 29 de janeiro de 2023 no distrito de Itapina, situada a cerca de 25 quilômetros da sede. O local foi escolhido como cenário do filme por ainda manter as características arquitetônicas dos antigos centros comerciais que se desenvolveram em torno da ferrovia. Em 2013, o distrito foi tombado pelo Conselho Estadual de Cultura para preservar seu conjunto histórico, arquitetônico e paisagístico.

Fundada por imigrantes europeus no final do século XIX, o distrito construído às margens do Rio Doce representou um importante centro comercial, financeiro e social entre os anos de 1910 e 1960. Para se ter uma ideia, nos anos de 1956 e 1959, Colatina foi o maior produtor de café do mundo e Itapina contribuía com 350 mil sacas do produto.

O distrito possuía casarões suntuosos, no estilo colonial e art déco, hospital, revenda de carros, oficinas, lojas diversas, teatro e até um cinema. O declínio veio com a erradicação dos cafezais e o desvio do tráfego por causa da paralisação das obras da ponte, isolando o lugar até os dias de hoje.

Distante no tempo, o centro econômico e cultural deu lugar a um vilarejo bucólico e tranquilo abraçado por paisagens verdes e pelos sons da natureza. A ponte inacabada, os trilhos do trem, as ruas largas feitas de pedra, os casarões com portas de madeira ajudaram a compor a atmosfera da história vivida por dois irmãos que precisam vender cocada na estação para ajudar a mãe no sustento da casa. O drama gira em torno da ameaça de perder o meio de sobrevivência da família com o impacto da retirada dos trilhos.  

“Foi muito bom gravar no sítio de Itapina porque a região abriga uma estação de trem e remete à história que eu conto de dois meninos que vendem cocada para ajudar a mãe. Quando eu viajava de trem, costumava ver meninos vendendo doces nas paradas do trem. Isso me comoveu muito porque eu também era pequeno e me inspirou a escrever esta história”, conta Fabrício.   

A escolha do antigo distrito como cenário para o filme é um gesto de valorização e reconhecimento histórico da localidade. “Esse trabalho reafirma a existência deste lugar e a importância do não esquecimento e, acima de tudo, revela como a arte serve para resgatar e para devolver a prosperidade a um lugar”, avalia o cineasta André da Costa Pinto, que acompanhou o trabalho de produção e filmagens, a convite do Instituto Marlin Azul. 

Texto: Simony Leite Siqueira

Fotos: Gustavo Louzada

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