Infinitos caminhos levam ao documentário

Das dez histórias selecionadas pelo Curta Vitória a Minas III para transformar em filmes, quatro resultarão em obras documentais. Durante as aulas sobre a linguagem e as técnicas audiovisuais, em preparação para a gravação dos curtas-metragens nas cidades, as autoras e autores das histórias estão descobrindo como documentar uma história guarda uma riqueza e uma complexidade encontradas na própria realidade.

Para começar, documentário não é jornalismo, nem uma obra institucional convencional. Trata-se de uma forma de representar o real a partir de um ponto de vista, do olhar de um observador atento e sensível. O documentarista escolhe um jeito singular de contar, registrar, revelar e interpretar o mundo através de imagens e sons.

Para um dos precursores da linguagem, John Grierson (1898-1972), documentário é o “tratamento criativo da realidade”. São tantas as formas e expressões deste gênero cinematográfico que até mesmo a ficção pode ser um recurso narrativo dentro da obra documental. Isso acontece, por exemplo, quando o documentarista reconstitui ou encena um acontecimento. São infinitas as articulações, as conexões e os modos de criar um documentário. O documentarista pode até inventar um jeito incomum ou uma estrutura inédita para iluminar um ou mais aspectos de uma história, destacando um personagem, uma comunidade, um lugar, um acontecimento, ou tudo isso ao mesmo tempo, ou ainda qualquer outro elemento de inspiração da obra.

A documentarista, produtora e pesquisadora audiovisual, Beth Formaggini, professora de Roteiro, Produção e Direção do projeto, destaca alguns passos fundamentais para realizar um filme documental. “Um documentário para ser consistente precisa de muita pesquisa, conhecer bem o assunto, conhecer muito bem os personagens, escolher de forma criteriosa, mas, ao mesmo tempo, não tem uma forma porque cada filme pode ser completamente diferente. A gente não precisa fazer sempre aquele documentário que é a entrevista, material de arquivo, que é uma linguagem mais jornalística”, explica. Segundo ela, a diferença entre o documentário e a reportagem é que o primeiro é uma pequena obra de arte e se pode criar o que quiser. “Você vai tocar as pessoas não necessariamente pelo assunto, mas pela forma. Porque é a forma que vai atingir quem está assistindo e levar a pessoa para uma emoção ou para uma consciência de uma situação. O conteúdo é importante e, para isso, a pessoa precisa se preparar muito para conhecer o objeto de trabalho”, explica a cineasta.

Porém, como encontrar esta forma original? Para a professora, apesar da linguagem audiovisual também conter seus limites, é possível contar uma história a partir de uma imensidão de formas. “Não existe uma fórmula quando o músico compõe uma obra ou quando o pintor produz o quadro. O cinema é a mesma coisa. O realizador (a) vai criar a sua própria linguagem, quanto mais for fiel a si próprio, melhor. O seu objeto também vai te dizer, se você o conhecer muito bem, como mostrá-lo. A liberdade de criação te ajudará a encontrar a forma original para mostrar aquele assunto de uma maneira poética, que vai tocar o expectador de uma maneira lírica e, ao mesmo tempo, criar um certo desconforto. Eu acho que se deve criar um certo desconforto no público, no bom sentido, com o cara saindo de lá mexido”, provoca a documentarista.

A imersão no mundo do cinema continua até 28 de abril, no Terraço, em Perocão, Guarapari (ES). A terceira edição transformará em documentário as seguintes histórias: “Trilhando entre as Cercas”, de Otávio Luiz Gusso Maioli, de Ibiraçu (ES); “Um Rio de Histórias”, de Márcia Cristina Cândico Cruz, de Conselheiro Pena (MG); “Boi Balaio”, de Mauro dos Santos Junior, de Belo Oriente (MG); e “Me disseram que Sou Negra”, de Alexsandra Mara Felipe Fernandes, de João Monlevade (MG).

A professora ficou impressionada com a diversidade das histórias. “A gente vem aqui para ensinar e acaba aprendendo muito. O interessante deste projeto é exatamente conseguir tirar das pessoas aquilo que elas já têm, já trazem na bagagem delas. Cada pessoa traz uma experiência diferente. E os projetos trazem histórias, sentimentos e lugares que passamos a conhecer. Estamos criando junto com elas dentro de um ambiente muito intenso de afetos. A pessoa está entregando a alma. Estou muito feliz de poder ajudá-las a construir estes sonhos. Cada filme deste é um sonho de alguém que apostou e vai fazer o filme”, celebra Beth Formaggini.

Texto: Simony Leite Siqueira

Fotos: Gustavo Louzada

Ficha de Inscrição

Assine

* indicates required