O caminhão-cinema pegou cedo a estrada no sábado (15/07) em direção a Nova Era (MG) para a última sessão do Curta Vitória a Minas II. As nuvens carregadas no céu e a baixa temperatura em torno de 18º durante a manhã e a tarde anunciavam uma noite ainda mais fria. No decorrer da montagem da estrutura, a Praça do Morro do Padre, no centro, se mantinha quieta e solitária. Com o cair da noite, aos poucos, os espectadores se aproximavam, se ajeitando ao redor, nos bancos e muretas da praça.

A pipoqueira acendeu o carrinho para iniciar a distribuição gratuita de pipoca. O chocolate quente chegou para aquecer a noite. As pessoas despontavam em grupos de todos os lados atraídas para o meio da praça iluminada pela luz exuberante da tela. De repente, o lugar estava preenchido de gente de todas as idades, famílias inteiras, para assistir ao filme “Bicicleta Envenenada”, ficção com roteiro, produção e direção da moradora da cidade, a auxiliar de serviços gerais Luciene Crepalde, a Dezinha.

Familiares, colegas de trabalho, amigos e vários moradores da comunidade de Morada dos Heróis aonde vive a diretora se espalharam entre os demais convidados pelas cadeiras e pelo entorno do espaço. O frio intenso se retirou e o calor do público passou a preencher o lugar. Antes da apresentação da mostra oficial, os espectadores foram acolhidos com a exibição de animações feitas por estudantes de escolas públicas através do Projeto Animação do Instituto Marlin Azul. O sanfoneiro Eliomar Gaiteiro também aqueceu o evento ao tocar a trilha sonora composta de modo especial para o grande filme do sábado.

Na abertura da mostra, Dezinha foi chamada à frente para saudar os espectadores e apresentar a obra. A diretora convidou todo o elenco para se colocar diante da tela e apresentou um por um para o público. A autora da história baseada em suas memórias recebeu uma homenagem da Associação dos Amigos do Bem dos Moradores do Bairro Morada dos Heróis. A mostra contou com a apresentação dos filmes “Holerite”, de Ademir de Sena, de Naque (MG); “O Último Trem”, de Fabrício Bertoni, de Colatina (ES) e “Um Olhar para a Maternidade”, de Patrícia Araújo, de Coronel Fabriciano (MG).

“Bicicleta Envenenada”, o último curta-metragem da noite, arrancou risadas da plateia envolvida pelo sentimento de afeto e pertencimento. “Foi um momento muito especial e de muita alegria e emoção vê-la contando a sua história. Estou ainda mais feliz por os personagens escolhidos para viver esta história serem moradores da Comunidade Morada dos Heróis. Eu amei e estou admirada ainda mais pela equipe, pela formação e pelo brilhante trabalho. Estar com a comunidade na exibição do filme é uma oportunidade para os moradores terem acesso a arte e a cultura audiovisual. Estamos muito felizes por nossa comunidade estar em destaque em um filme contando a história de uma moradora do nosso bairro. A palavra é gratidão por tudo”, destaca a presidente da Associação dos Amigos do Bem dos Moradores do Bairro Morada dos Heróis, Maria Luciana Nerio.

A ficção resgata um momento marcante da infância da autora quando chega a sua vez de passear de bicicleta com os pais até a feira da cidade. Como eram muitos irmãos, esse dia podia levar alguns meses. Narrada pela própria autora de um jeito divertido e afetuoso, a história conquistou ainda mais quem assistia a obra pela primeira vez. “Eu achei a sessão sensacional! Primeiro, ver o brilho no olhar de cada um que estava aqui, do público presente, e sentir este acolhimento de uma pessoa que é da comunidade. A exaltação da cultura de uma pessoa da comunidade. É um resgate cultural. Também é um empoderamento das mulheres. Encorajar as mulheres a participar é muito bacana. Achei o filme espetacular por causa da história. Eu também vim da zona rural. Então, eu sei que a história se assemelha à de muitas pessoas que estavam aqui presentes. O legal do filme foi que ela contou uma história de vida e, ao mesmo tempo, exaltou as coisas boas. Apesar da realidade dura da época, ela conseguiu tirar a essência de ser o que ela é hoje. Foi muito bom!”, relata a Analista de Relações com a Comunidade, Joisceany Moreira Ferreira da Silva.

A operadora da Estação de Tratamento de Água, Mayra Eduarda Martins dos Santos, interpretou Joana Moreira Mendes, mãe de Dezinha. “Eu gostei demais do filme, achei muito legal. Pelo jeito o pessoal também gostou muito porque estava todo mundo falando e parabenizando. Ficou melhor do que eu esperava. Ficou muito bem feito. Ver a reação do povo, ver o pessoal assistindo e achando engraçado foi a melhor parte”, conta a atriz. O motorista da Secretaria de Saúde, Vitor Martins dos Santos, atuou em um filme pela primeira vez para interpretar José Domingues Fernandes Mendes, mais conhecido como Zé Domingues, pai de Dezinha.  “Pensa num cara satisfeito, com o dever cumprido. Poder ter feito o papel do pai da Dezinha pra mim foi um privilégio porque eu conheço a família faz muito tempo. E ver o sorriso no rosto de quem estava lá assistindo e até mesmo no meu foi top demais. Foi pra mim uma experiência nova, nunca tinha feito. Fui pêgo de surpresa. Estou até pensando em fazer outro. Vou fazer uma história e mandar para concorrer. Gostei demais! Só tenho a agradecer a Dezinha e a toda equipe”, destaca Vitor.

Sentada na primeira fila do cinema, ao lado da filha, Joana Moreira Mendes participou das cenas documentais do curta-metragem. “Eu achei maravilhoso a minha filha participar desta cultura maravilhosa aqui em Nova Era. Chegar a fazer um filme não é fácil. Eu achei muito bonito. Houve muita curiosidade. Todo mundo queria ver. Foi muito bom. A minha história vai ficar para sempre”, comemora Joana. A emoção, a alegria e a gratidão inundaram o coração de Dezinha.

“Eu nunca imaginei que fosse valer tanto a pena ter feito este filme porque ele ficou melhor do que eu imaginava. Eu adorei cada segundo do filme. Nunca imaginei que fosse tão gratificante ver a minha história passada num telão com várias pessoas assistindo, todo mundo rindo. Eu nunca imaginei que fosse ficar tão bom. Eu adorei e não me arrependo nem um segundo de ter participado do Curta Vitória a Minas. Foi especial demais. As pessoas todas vibrando e rindo a cada segundo. E, antes do filme acabar, já estavam me cutucando e falando que tem que continuar. A única coisa que posso dizer é que valeu a pena cada segundo do meu tempo, cada segundo das minhas noites, quando fiquei pensando como eu ia fazer depois que vi que pra fazer um filme não era nada fácil. E mesmo eu vindo lá da roça, lá daquele fundão, eu consegui fazer um filme que chamasse a atenção da cidade toda. Até o frio que estava congelando de dia, na hora do filme sumiu. Veio um calor, a minha vergonha passou. Eu estava muito feliz mesmo. Nunca passei por uma experiência desta de todo mundo sentado esperando minha vida passar naquele telão grande”, celebra a diretora.

Texto: Simony Leite Siqueira

Fotos: Gustavo Louzada