Artista visual fará filme sobre antiga tradição das cruzes enfeitadas

Das histórias guardadas da infância, a artista visual Rita Bordone escolheu uma lembrança para transformar em filme. Em meados dos anos 70, na pequena Bom Jesus do Galho (MG), Rita tinha onze anos e seus olhos brilhavam diante do papel de seda colorido recortado por sua mãe para enfeitar cruzes de madeira que seriam instaladas em diversos pontos da casa. A menina acostumada aos tons terrosos e pálidos da estrada de chão nunca esqueceu o encantamento pelas cores das cruzes decoradas como um gesto de gratidão e um pedido de proteção a Nossa Senhora.   

Essa antiga tradição católica em homenagem a Maria é a inspiração para a história “Santa Cruz”, que será gravada de 08 a 10 de fevereiro de 2023, em Ipatinga, pelo Curta Vitória a Minas II. A ficção é um resgate das memórias da artista durante o tempo em que morou na roça ao lado dos pais e dos oito irmãos.

“Mamãe acreditava neste ritual, pois o cultuava com tanta convicção e carinho. E, se por algum motivo, deixasse de enfeitar, era uma tristeza muito grande pra ela. O ritual era religioso, mas, na minha visão, como criança, era mais artística diante daquelas cores, era artesanal com o ato de cortar papel colorido e ainda envolvia as caminhadas que eu fazia pela estrada para identificar qual cruz mais bonita”, conta a diretora que vive em Ipatinga desde 1997.

Fé, devoção e festa

A menina nasceu em um ambiente festeiro e afetuoso. Os avós maternos costumavam receber muitos visitantes em casa. Os pais prestigiavam os eventos culturais e celebravam as festas populares e religiosas da comunidade. Sua mãe, Maria Pires de Faria, benzedeira, costureira e artesã, confeccionava as cruzes e as distribuía pela casa, nas janelas, na porta do lado de fora e no paiol aonde se guardava os alimentos.

“Era um momento de festa na minha casa. Eu ficava esperando. Acho porque o ritual era feito com papel colorido e eu não tinha muito acesso a estas cores. Eu só fui ter uma caixa de lápis de cor aos 14 anos. Era um ritual que todo mundo respeitava para proteger as casas e deixá-las bonitas. De um ano para o outro, o papel já ficava desbotado. Não podia tirar a cruz da porta nem da janela. Elas permaneciam por todo ano. E eram novamente enfeitadas”, lembra Rita.

Quando surgiu a oportunidade de participar do concurso de histórias do Curta Vitória a Minas II, a artista visual buscou no passado uma das memórias mais queridas ao lado da saudosa mãe. “É uma forma de homenagear a minha mãe, uma mulher extremamente carinhosa, inteligente, artista. Eu tenho um carinho muito grande por estas cruzes e continuo fazendo em casa para presentear os meus vizinhos. Eu fazia estas cruzes na madeira, mas, hoje, estou fazendo no isopor. Eu quero contar a minha história de encantamento com essas cruzes”, destaca. As filmagens acontecerão nos distritos de Tribuna e Ipaneminha, no município de Ipatinga/MG.

Saiba mais sobre a diretora

O encantamento pela arte e a cultura acompanhou a trajetória da mineira. Formada em Artes Visuais pela Universidade de Brasília (UnB), participou de diversas oficinas de artes visuais, teatro, dança contemporânea, cenografia e maquiagem, se especializou na arte da impressão têxtil botânica em utilitários e costuma utilizar objetos do cotidiano para criar exposições com temáticas sociais e ambientais em galerias de arte.

Rita integra a Federação Nacional de Artesanato, faz parte do Movimento Fashion Revolution pela sustentabilidade na moda, em favor do preço justo, contra o trabalho escravo, em defesa do meio ambiente e dos direitos humanos, e ainda participa do Wikiaves, um site brasileiro que reúne fotos e sons de diferentes espécies de pássaros enviados por observadores de pássaros.

Texto: Simony Leite Siqueira

Fotos: Gustavo Louzada

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